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Juiz manda prefeito de Castelo do Piauí cancelar contrato com empresa de amigo

O prefeito Magno Soares havia firmado contrato com a empresa José Soares de Abreu Júnior ME, de propriedade de Júnior Abreu.

O juiz Alexandre Alberto Teodoro da Silva, da vara única da comarca de Castelo do Piauí, acolheu ação civil pública proposta pelo Ministério Público e determinou que o prefeito Magno Soares, do município de Castelo do Piauí, anule o contrato firmado com a empresa José Soares de Abreu Júnior ME. A sentença foi proferida no dia 30 de novembro de 2023.  

Foi estipulado um prazo de 30 dias para cumprimento da decisão. Caso não seja acatada, o prefeito poderá ser penalizado com multa diária no valor de R$ 10 mil.

Foto: Divulgação/FacebookMagno Soares, prefeito de Castelo do Piauí
Magno Soares, prefeito de Castelo do Piauí
Ação Civil

O Ministério Público havia tomado conhecimento de denúncia em outubro de 2020 sobre a contratação de oito caminhões promovida pela Prefeitura de Castelo do Piauí com a empresa José Soares de Abreu Júnior ME (nome de fantasia empresa JJ Serviços) ao custo de R$ 780 mil.

De imediato, foi instaurado uma notícia de fato para apurar possíveis irregularidades no contrato. Para tanto, foram notificados o prefeito Magno Soares e o empresário para prestarem esclarecimentos sobre o assunto.

Após ser notificado, o prefeito relatou que a locação ocorreu mediante processo licitatório e que foram cumpridas todas as exigências legais.

Quanto ao empresário, não foi possível localiza-lo. Foi enviado ofício para o e-mail da empresa, mas não foi obtida resposta. Também fora enviado via Correios com AR para o endereço que consta no CNPJ, porém a correspondência voltou com a informação de que o número não existia na Rua 7 de Setembro, Bairro Perpétuo Socorro.

Após iniciada apuração do caso, o Ministério Público descobriu sobre a relação de amizade e de apoiamento político existente entre o prefeito e o empresário Júnior Abreu. “Esta afinidade política, e afetiva, pode ser visualizada facilmente por intermédio de uma breve análise de suas redes sociais. As fotografias fisgaram tais personagens em momentos de descontração/divertimento, despidos das vestes próprias das funções públicas exercidas, o que demonstram que os mesmos formam um restrito núcleo duro político e social (de amizade)”, salientou.

O representante do órgão ministerial, identificou, após consulta ao site da Receita Federal, que a empresa individual José Soares de Abreu Júnior ME havia se transformado em José Soares de Abreu Júnior Eireli (com nome de fantasia J. Serv. Construções e Serviços) e também havia mudado de endereço.

Em posse dos documentos sobre a licitação tomada de preço nº 03/2019 que tinha por objeto prestação do serviço de locação de oito caminhões para atender às necessidades do município, o órgão ministerial achou estranho o termo “necessidades”, por se tratar de caráter genérico, uma vez que seria mais adequado especificar o objeto no certame. O mesmo absurdo foi verificado no Anexo I do Edital, o que pode ter impossibilitado a participação de outras empresas na licitação, pois não se sabia qual a finalidade para locação dos veículos.

Outro ponto apontado como ilegal, estava contido na cláusula décima, letra B, item 8: “Não transferir, no todo ou em parte, a execução do Contrato, sem prévia anuência da CONTRATANTE.”

“Eis, assim, mais uma incongruência do Edital e do Contrato, visto que a possibilidade de subcontratação, se for o caso de admiti-la, deve estar aventada nos dois atos, com o limite permitido, em cada caso, pela Administração (inteligência do art. 72 c/c 78, VI, ambos da Lei 8666/93). Então, como o Edital foi omisso em relação a esta possibilidade, não poderia o contrato inovar prevendo uma possível subcontratação, especialmente quando esta excepcionalidade não estaria condicionada a limites prefixados, mas assujeitada, por outro lado, ao amplo arbítrio do gestor público, bastando-o, assim, anuir com a transferência total ou parcial da execução do contrato”, ressaltou.

Acrescenta também, que em nenhum momento a prefeitura procurou saber se a empresa tinha capacidade técnica ou possuía veículos, de propriedade da empresa, aptos a realizarem os serviços contidos no Edital. O que causou bastante estranheza ao órgão ministerial.

Na realização do certame, a empresa de Júnior Abreu foi a única que apresentou proposta e foi consagrada vitoriosa. A comissão de licitação, presidida por Aleks Sousa Oliveira, havia habilitada a empresa após ter analisado toda a documentação e não ter encontrado nenhuma irregularidade. Posteriormente, o prefeito homologou e firmou o contrato.

O contrato com a empresa foi assinado no dia 15 de abril de 2019. O extrato foi publicado no Diário Oficial dos Municípios em 14 de maio do mesmo ano e dois dias após da publicação, a prefeitura realizou o primeiro pagamento no valor de R$ 64.920,00.

O órgão ministerial constatou que nos anos de 2015/2016 a empresa só possuía apenas uma funcionária registrada. Além do mais, foi comprovado também que a empresa não tinha nenhum veículo de sua propriedade. Somente após receber o primeiro pagamento do município, Júnior Abreu adquiriu um veículo modelo VW 26 260 no dia 09 de maio de 2019.

No decorrer dos anos o empresário comprou mais dois veículos. Para cumprir o contrato que previa a locação de 8 carros, Júnior Abreu optou por alugar mais cinco de terceiros.

Durante a assinatura do contrato até a data do último pagamento (10.02.2021), o empresário havia recebido dos cofres da prefeitura de Castelo do Piauí o montante de R$ 1.168.560,00 (hum milhão, cento e sessenta e oito mil, quinhentos e sessenta reais).

Outro ponto grave percebido pelo Ministério Público refere-se ao fato que na época da contratação da empresa, Júnior Abreu ocupava (à época da contratação da empresa em 2019) cargo comissionado de auxiliar de apoio Judiciário no Tribunal de Justiça do Piauí com remuneração mensal de R$ 5.031.60. “Nessa condição, José Soares de Abreu Júnior se encaixa, por força do disposto no art. 2º c/c art. 10, II, da Lei Complementar Estadual nº 13, de 3.1.1994, ao conceito de servidor público civil do Estado do Piauí, estando, por via consequencial, sujeito aos seus dispositivos, inclusive às suas proibições. Na arena das interdições, dispõe o art. 138, X, da referida norma de regência, o seguinte: Art. 138 da Lei Complementar Estadual nº 13/94. Ao Servidor é proibido: (…) X - participar de gerência ou administração de empresa privada, sociedade comercial ou exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário”, esclareceu.

Neste sentido, a empresa de Júnior Abreu jamais deveria ter sido contratada pelo município, uma vez que a legislação proibia.

Na avalição do Ministério Público, a licitação promovida pelo prefeito Magno Soares foi realizada com o intuito de beneficiar seu amigo. “O prefeito, mesmo sabedor da condição do Sr. José Soares de Abreu Júnior (auxiliar de apoio judiciário do TJPI, lotado, desde 01.12.2017, no núcleo de apoio das unidades judiciárias de 1º e 2º graus), que é administrador de empresa irregularmente constituída, homologou certame licitatório em que o contratado, que é seu amigo pessoal, sagrou-se vencedor. Ademais, homologou certame onde a empresa vencedora nitidamente não possuía capacidade operativa para cumprir fielmente o objeto do contrato (relembre-se que o Sr. José Soares de Abreu Júnior, quando sua empresa foi habilitada e alçada ao status de vencedora no bojo da TP nº 03/2019, não possuía um veículo sequer que atendia as necessidades do Município, adquirindo posteriormente 03 e alugando mais 05 de propriedade de terceiros). Destaque-se, também, que o primeiro veículo comprado pelo contratado para alugar para o Município foi adquirido do Sr. Francisco Ferdinand Lima, irmão de criação do Prefeito José Magno”, enfatizou.

Na ação, foi pedido ao magistrado liminar para suspender os pagamentos e anulação do contrato do município com a empresa.

Outro lado

O Viagora pocurou o prefeito Magno Soares para falar sobre o assunto, mas até o fechamento da reportagem o gestor não atendeu as ligações.

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