Promotora quer desmistificar que Direitos Humanos são para bandidos
A promotora de Justiça Myrian Lago, titular da 49ª Promotoria de Justiça falou também sobre a carreira, dificuldades e ações na instituição.
O Ministério Público é uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, CF/88). O Viagora começa uma série de entrevistas com os promotores do MPPI para falar sobre atuação, carreira, dificuldades, ações da instituição, dentre outros assuntos.
A promotora de Justiça Myrian Lago, titular da 49ª Promotoria de Justiça, com atuação na defesa dos direitos humanos, é a primeira entrevistada.
- Foto: Hélio AlefPromotora falou sobre diversos assuntos, dentre eles as ações da promotoria
Bacharel em direito pela UFPI, Myrian Lago é Promotora de Justiça desde 1988. No Ministério Público, atuou nas Promotorias de Justiça de Amarante, Regeneração, São Pedro, Campo Maior, São Félix e Água Branca. Foi a primeira titular da 28ª Promotoria de Justiça da capital, com atribuições na defesa da pessoa com deficiência e idoso.
No âmbito do MPPI, atuou também como membro do Grupo de Trabalho do Sistema Prisional e do Grupo de Trabalho da Saúde Mental de Pessoas em Conflito com a Lei. Entre 2004 e 2006, auxiliando a Corregedoria Geral do Ministério Público, foi membro da Comissão Avaliadora dos Promotores de Justiça Substitutos. Foi membro colabora do Conselho Nacional do Ministério Público, atuando na Comissão de Direitos Fundamentais. Entre 2014 e 2015, atuou como Coordenadora do Núcleo das Promotorias de Justiça da Cidadania e do Meio Ambiente. Atualmente é Promotora de Justiça titular da 49ª Promotoria de Justiça de Teresina-PI, com atribuições na defesa da cidadania e dos direitos humanos.
A representante do Ministério Público possui um trabalho voltado à cidadania, ao respeito das minorias e dos direitos humanos, especialmente na defesa das comunidades LGBTTT e na defesa das pessoas em situação de rua.
Viagora-Promotora, o que a levou a optar pelo Direito e ingressar na carreira do Ministério Público do Estado do Piauí?
Myrian Lago: Eu fiz vestibular no ano de 1982 pra direito por influência do meu pai que era da carreira jurídica e na época era mais conveniente para mim, eu fiz até teste vocacional, e foi uma consequência natural. Para o MP eu tinha um professor que era uma referência no meu curso e nesse tempo não tinha muitos concursos, foi o segundo concurso que eu fiz e fui aprovada, eu tinha 23 anos eu não tinha consciência do que era, o MP de hoje é deferente do MP anterior baseado na nova constituição.
Viagora-O que a senhora destaca na sua trajetória?
Myrian Lago: Eu trabalhei 12 anos como promotora no interior do estado, e uma atuação difícil porque no interior a gente tem que trabalhar com tudo, é uma realidade diferente da de hoje, quando eu entrei no MP a gente ficava dependente e hoje a gente tem uma estrutura muito boa. Quando eu fui promovida e cheguei em Teresina eu passei oito anos atuando só na área criminal, e chegou um momento que eu achei que eu tinha que dar uma nova perspectiva para minha carreira, e foi quando foi criado esse núcleo que estou hoje e deixei de ser promotora criminal e passei a atuar em 2012 nessa promotoria.
- Foto: Hélio AlefPromotora Myrian Lago concedeu entrevista ao Viagora
Viagora-A defesa dos Direitos Humanos e a promoção da cidadania são duas frentes de atuação do Ministério Público, como são trabalhadas essas frentes, e quais são as atribuições do promotor de Justiça nessa área?
Myrian Lago: A defesa da cidadania é um Conceito muito amplo dentro do núcleo que são oito promotorias, atualmente nós temos várias atribuições definidas, saúde, educação, meio ambiente, defesa do consumidor da pessoa idosa e do deficiente, e a promotoria de direitos humanos é a nossa atribuição, ela é definida por exclusão, tudo que não for atribuição das outras promotorias vai cair no conceito da nossa promotoria. A gente já atuou no combate a intolerância religiosa, defesa do estado laico, defesa da população LGBT, até agora nós atuamos em 12 matérias, mas dada a amplitude pode parecer algo ainda que a gente não fez.
Viagora- Existe uma convicção muito forte que os direitos humanos são para bandidos, isso é verdade? Qual é a real natureza sobre o conceito de Direitos Humanos?
Myrian Lago: Na verdade existe essa concepção completamente equivocada, é um trabalho nosso descontruir esse conceito errôneo, dada a vivência no Brasil das políticas que ocorrem e da própria história principalmente a partir do golpe militar de 1964 onde o conselho de direitos humanos foi praticamente abolido e foi sendo reconstruído esse conceito que eu considero equivocado, o conceito de direito humano é simples, porque direito humano é aquilo inerente a nossa própria natureza, então tudo é direito humano, o direito de você entrevistar, o direito deu falar, o nossos direito de trabalhar em um ambiente saudável, direito a educação, a saúde, então é uma coisa muito simples se você associa a sua condição humana. Quando eu vim em 2012 para promotoria e em 2015 eu fui indicada como membro do conselho estadual de direitos humanos e lá na reunião a gente sempre batia nisso que precisávamos fazer as pessoas entenderem o real conceito de direitos humanos. Então essa indignação eu sempre tinha porque dizem” há vocês apoiam bandidos”, a gente não apoia bandidos a gente apoia que a pessoa tenha direito de defesa bem como a vítima que foi ofendida porque tudo é direito humano, e a partir dessa indignação sobre o conceito nós construímos um projeto aqui no MP, idealizado por mim em parceria com o Centro de Apoio de Defesa e da Cidadania, com a doutora Flávia Cordeiro, onde exatamente o projeto existe para desmitificar esse conceito equivocado, para dizer realmente o que é direito humano, o projeto é #issoedireitohumano a gente está desenvolvendo, nós lançamos umas cartilhas no ano passado e esse ano vamos desenvolver nas escolas e universidades.
Viagora- Quais são os casos mais frequentes na 49 ª Promotoria? Em média, quantos pedidos de investigação chegam mensalmente?
Myrian Lago: Nós temos uma matéria bastante variada primeira atuação foi em relação a defesa da população LGBT, hoje a gente já trabalhou todas, hoje a gente trabalha muito forte a questão do combate a discriminação racial, a garantia do direto a moradia, e defesa do direto da população em situação de rua, são casos mais frequentes nosso. Outro ponto que a gente está atuando muito é a garantia do direito a assistência social. Que é a fiscalização do sistema único, com trabalho junto aos Creas, Cras, centros pops, toda a rede socioastencial pertinente a nossa atribuição. A gente tem 20 casos por mês, a gente tem muitas representações que recebemos e demandas que a gente age através de oficio. O MP tem essa postura de ser proativo.
- Foto: HélioAlefPromotora Myrian Lago
Viagora- Como a senhora avalia o papel da imprensa como fonte, já que através dela o Ministério Público detém uma vasta informação ?
Myrian Lago: Naturalmente, a gente vê algo importante na imprensa que seja da nossa atribuição e daí já fazemos o pedido via oficio, a imprensa tem um papel importante e as redes sociais também. E as vezes até dos outros ministérios públicos nós pegamos a informação e agimos. Mesmo sendo de rede social, portal a gente tem como agir via oficio.
Viagora- Quais as principais dificuldades na execução do trabalho?
Myrian Lago: Nos últimos tempos a nossa condição melhorou muito, mudamos de prédio, a gente teve dificuldades de pessoal, mas hoje essa demanda foi suprida, do ponto de vista estrutura física, hoje não temos o que reclamar, eu tenho 30 anos no MP e essa melhoria foi de 4 anos para cá. Agora dentro da minha área especifica uma dificuldade eu sinto é essa falta da compressão do que são os direitos humanos, aqui dentro também a gente vê e é tido as vezes como trabalho de menor importância, a gente esgota tudo em relação ao trabalho na nossa atribuição. Então essa dificuldade de não ser compreendido existe, até porque hoje na minha opinião pessoal a atual preferencial dentro do MP é a criminal, o encarceramento, aumento das penas, e eu acho que a nossa atuação preventiva é o que vai reduzir esse caos quanto a falta de segurança. A nossa atuação preventiva é importante para isso, dentro do conceito da constituição, dentro do MP como o todo. Mas não existe nenhum obstáculo na minha atuação.
Viagora- Na atividade exercida por um Promotor de Justiça, são encontradas dificuldades como a atuação no Interior do Estado, por exemplo. Como essas dificuldades poderiam ser resolvidas?
Myrian Lago: No interior o promotor é um generalista, é o mesmo promotor criminal, que dá parecer que faz o júri, que vai fazer a defesa da educação, dos direitos humanos, de tudo, então a grande dificuldade é essa ser uma cabeça só pensando tudo. Quando a gente chega em uma comarca grande é que a gente vem se especializar. Mas para isso existe os centros de apoio para fazer toda a orientação para que o colega esteja munido no aspecto físico.
Viagora: Na sua opinião, o Ministério Público conseguiu evoluir nesses últimos anos? Se sim, em quais aspectos?
Myrian Lago: Evoluiu muito, absurdamente, mil por cento do ponto de vista estrutura física nos não tempos o que reclamar, e isso não teve toda vida, teve um momento que a gente comprova o papel que ia usar, trabalhei muito tempo na máquina de escrever. Hoje nós não temos dificuldades em fazer nenhuma diligência. Hoje se você fala do MP as pessoas associam defensor dos direitos fundamentais, mas o papel que rege na maioria das pessoas é a do promotor que vai acusar e mandar prender.
Viagora: O que a senhora destaca de ações mais relevantes na Promotoria da Cidadania e Direitos Humanos ?
Myrian Lago: A gente tem muitas ações na justiça na garantia dos direitos LGBT, na parte de moradia nós fizemos uma grande atuação quanto ao Programa Minha Casa, minha vida, temos uma atuação muito forte na questão das apropriações irregulares para garantir o direito de moradia garantido das pessoas. Em todo o sistema de assistência de Teresina serão fiscalizados para verificar se o sistema está funcionando ao contento. O cras e um equipamento importantíssimo dentro da rede social municipal que é pouco visualizado pela imprensa. A gente trabalha nisso para cobrar que munícipio forneça esse serviço de melhor qualidade para a população mais vulnerável economicamente. Estamos trabalhando agora por exemplo, com relação ao sistema prisional na Irmão Guido para garantia dos direitos humanos. A gente faz visita ao local, a gente tem uma equipe de perícia com vários profissionais de muitas áreas que irão com a gente no local para ter o olhar especifico e nos dá um laudo orientando nossa atuação.
Ministério Público do Estado do Piauí - MPPI
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